Criaturas do Senhor

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Criaturas do Senhor parece ser o filme mais maduro produzido pela A24. A paisagem se impõe, uma ilha afastada com uma pequena comunidade irlandesa que vive da pesca de ostras. Esse ambiente é fundamental para compor a atmosfera sombria, fria e melancólica que compõe um tom dramático junto com a trilha – que sempre intervém de forma satisfatória. 

O som é algo que merece seu destaque, a maré, o som das borbulhas d’agua, das batidas de portas, dos sapatos pela casa e principalmente, o silêncio que abre espaço para a maravilhosa atuação de Emily Watson, sem precisar ao nos dizer o que acontece em cada ato do longa. 

Tudo segue bem, a vida pacata de Aileen (Watson) como uma das gestoras da fábrica que embala ostras, é bastante monótona. Ela cuida dos afazeres de casa, ajuda a cuidar do neto e é a cuidadora do genro, um senhor que não fala e é agressivo, tudo ocorre em um ciclo contínuo e silencioso. 

O tom perturbador dita a obra, tanto que a introdução de Brian O’Hara, personagem de Paul Mescal, é feita durante um velório. Ele adentra a sala e cumprimenta todos de forma gentil e calorosa como um forasteiro que volta para casa e logo percebemos que Aileen devota o coração e os olhos para seu filho pródigo.

Persona non grata pelo pai, a chegada mexe com a estrutura familiar. A mãe tenta sustentar um clima amistoso, mas é o hostil que prevalece.Brian estava vivendo na Austrália, não sabemos o que fazia, muito menos o que o motivou a voltar, a dúvida paira, mas ele trata de dissipá-la mostrando que está feliz em estar de volta e se empenhando em  trabalhar na fazenda de ostras da família.

O longa parece testar a atenção do espectador haja vista os diálogos nem sempre são precisos e as pistas são captadas pelo comportamento dos personagens e não necessariamente por cenas didáticas e diálogos explicativos. 

A ambiguidade do personagem de Mescal é certamente um dos trunfos de Criaturas do Senhor. Gentil, agradável, sorridente, trabalhador, mas misterioso, talvez perigoso. 

Enquanto eu te falo sobre todos esses pontos, deixo de te dizer que esse filme também aborda temas polêmicos de forma muito sutil graças a Saela Davis e Anna Rose Holmer.

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Nessa reviravolta que ocorre, a relação apaixonada e protetiva da mãe, que ganhou mais sorrisos com a chegada de Brien, passa a dar espaço a uma expressão tensa, atordoada e confusa pois a decisão tomada colocou em jogo a construção da imagem que tem do filho. A perturbação causada pelo retorno do filho a deixa em um lugar desconfortável e o filme aborda relações familiares, femininas e posicionamento, é nesse momento que Watson brilha ainda mais com uma performance que sustenta a tensão da narrativa e expressa tudo que não é dito em palavras. 

O clímax ocorre de forma impactante. É como se depois de todo um furacão, tudo se dissipasse e a calmaria voltasse a aportar em uma ilha desolada e sem esperança de um futuro bom.

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