
Para quem lê o nome e espera, assim como eu, um filme aguerrido, sinto informar que não terá grandes cenas de lutas para se apegar. A abordagem escolhida pela diretora Débora Mamber é diferente, mais sensível, privilegia uma visão filosófica sobre a arte marcial, o karatê, pra ser mais específica.
Ela busca abordar como a luta japonesa é ferramenta de resistência, sabedoria, autoconhecimento e um caminho para aqueles que desejam encontrar paz.
‘Um Samurai em São Paulo’ foi um filme foi montado e remontado muitas vezes, conforme Mamber revela. A ideia de criar um documentário surgiu da sua paixão pela prática de mais de uma década e pela sua curiosidade pela aura quase mística do sensei, seu professor e mestre japonês, Taketo Okuda.
O processo criativo amadureceu os olhares para a obra ao longo de 10 anos e alteraram a construção da história e captação das imagens. “Eu vim do jornalismo, não conhecia a linguagem de documentário, peguei minha câmera e comecei a documentar”, conta a diretora.

Mamber explicou que houve uma primeira versão do longa com a comunicação toda em português e recheada de entrevistas, o que foi cortado na produção final e nos privilegia com a voz de Okuda narrando trechos de sua história no seu idioma natal.
A construção apresentada é uma colcha de retalhos muito bem feita que entrelaça os acontecimentos da vida da avó de Débora e a luta contra o nazismo e a busca por sobrevivência, a da evolução histórica do karatê passando por esse período, a chegada do karatê no Brasil, a ditadura militar e a prática como instrumento de resiliência.
A narração em primeira pessoa é agradável e tudo na produção do documentário é como um escorredor que nos apresenta um passado para despertarmos e nos colocar sempre em estado de luta, como samurais, atentos e fortes.

Ao invés de golpes fatais, Mamber optou pela simbologia, tirou a figura do samurai mercenário, competidor ou mitológico para alguém de carne e osso, porém elevado, com um estoicismo admirável.
Durante o debate após a exibição, realizado no no Cine Satyros, em São Paulo, Débora comentou que o sensei Okuda não chegou a ver a versão que está nos cinemas, a demora pela liberação dos recursos financeiros no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, atrasou a produção e a finalização não foi concluída a tempo para que ele assistisse, mas chegou a receber uma cópia sem as imagens de banco, que entraram somente após o recebimento do valor do edital.